sábado, 29 de abril de 2017

World Book Tour Março: Albânia

Continuando com a volta ao mundo em leituras, iniciativa do grupo do Facebook World Book Tour, o mês de Março seria para ler autores originários da Albânia. Apenas terminei o livro escolhido esta semana mas gostei bastante e fiquei extremamente surpreendida e impressionada com alguns dos usos e costumes albaneses que são relatados. Efectivamente, são estas descobertas relativas as diferenças culturais que fazem com que me esteja a dar imenso gozo participar neste projecto.

Em Maio, segue-se Andorra. Já li todos os países que estão para trás e estou ansiosa por descobrir mais sobre Andorra, um pequeno país sobre o qual não sei praticamente nada para além do facto de se situar no continente europeu. Tinha este mesmo desconhecimento face à Albânia pelo que resolvi fazer uma pequena pesquisa para, posteriormente, prosseguir com a leitura. Aliás, tenho feito o mesmo com todos os países. 




A Albânia é um pequeno país situado no sudeste da Europa que pertencia ao antigo império Otomano. A história deste país está marcada por inúmeros conflitos relacionados com questões políticas que marcaram grandemente os albaneses. A sua capital é Tirana.

O país é extremamente montanhoso pelo que, os naturais desse país se denominam a si próprios de skipetars, ou seja, "moradores de terras altas". É dos países menos desenvolvidos e mais pobres da Europa mas, ao longo dos últimos anos, têm-se assistido a um aumento do número de turistas estrangeiros os quais buscam, sobretudo, as belas praias albanesas, muitas vezes designadas por Riviera Albanesa o que acaba por ser favorável para a economia.

O Kanun é um código de leis consuetudinárias que o povo trás desde a era do Bronze e que, após o colapso do regime comunista, voltou a vigorar em áreas mais remotas do território. Neste sentido, os homicídios são um problema crescente, especialmente as "vinganças de sangue". Dados relativos ao ano de 2014, apontam para que cerca de 3 mil famílias estivessem envolvidas em vinganças de sangue sendo que, desde o fim do comunismo, já se contam cerca de 10 mil mortos devido a esta problemática.

Posto isto, o livro que escolhi não podia ser mais representativo do país e das suas questões uma vez que aborda a temática das vinganças de sangue.




Editora:Publicações Dom Quixote
Ano publicação: 2000
Nº páginas:  186 páginas
Pontuação atribuída: 4 estrelas no Goodreads





Abril despedaçado é um livro que trouxe comigo da biblioteca e que, desde logo, me despertou a curiosidade pelo facto de se focar em práticas culturais patentes na Albânia e que para mim eram totalmente desconhecidas. 

Sob três pontos de vista, o de um rapaz que reside no planalto, o de um casal em lua-de-mel e o de um intendente do sangue, o autor aborda a problemática consuetudinária mais concretamente, o direito de resgatar o sangue. Isto mais não é do que, um direito que subsiste em dadas famílias, geração após geração, e que faz com que umas tenham direito de matar uma pessoa da outra família e vice-versa. Conjuntamente a isso é acrescido o pagamento de um imposto a um príncipe do planalto albânes. Esse dinheiro e essas cobranças são geridas pelo intendente do sangue. 


"Pouco faltou para desatar a rir. Não podia viver antes de ter matado! Só depois, quando estivesse por seu turno ameaçado de morte, é que, para ele, a vida recomeçaria."


Ora o rapaz que referi e cujo nome é Gjorg, vê-se a braços com a missão de matar um membro de uma família que havia matado o seu irmão e, ao longo da narrativa, somos confrontados com os seus sentimentos, alguns deles contraditórios, relativamente ao matar e, posteriormente, ao facto de ter ele próprio uma sentença de morte.


"Um ano e meio depois do assassínio do irmão, a mãe tinha acabado finalmente por lavar a camisa que o infeliz usara naquele dia. Durante um ano e meio, ensanguentada, ela permanecera pendurada, como exigia o Kanun, no andar de cima da torre, à espera do resgate do sangue. Quando as manchas de sangue começavam a amarelecer, dizia-se, era o sinal absoluto de que o morto começava a atormentar-se por ainda não ter sido vingado."

Era esperado que ele vingasse o irmão, que ele matasse, mas isso não deixa de lhe criar vários constrangimentos e vários questionamentos relativamente aos usos e costumes da sua gente. Isto vai sendo dado a conhecer ao leitor, durante a viagem que Gjorg faz com o intuito de pagar o imposto de sangue, após ter morto um homem. Durante essa jornada, que parece não ter fim, ele cruza-se com vários outros habitantes do planalto que vivem intensamente as suas práticas como sejam as relativas ao noivado/matrimónio.

"Observando os baús coloridos que continham sem dúvida o enxoval da noiva, perguntou a si próprio em que esconderijo, caixa, algibeira, colete bordado, os pais da noiva tinham posto o «cartucho do enxoval», com o qual, segundo o Código, o marido tinha o direito de matar a jovem esposa se ela tentasse alguma vez abandoná-lo."

São relatos como o acima citado que impressionam e que me fizeram reflectir e, de certo modo, revoltar. Também não deixa de ser completamente aberrante o facto de um jovem casal residente em Tirana ter escolhido o planalto para passar a sua lua-de-mel. Tal foi determinado com vista ao marido, escritor de profissão, ter uma noção in loco das práticas vigentes. A jovem esposa resigna-se com esse facto mas, ao longo da história, vai-nos sendo apresentada a sua revolta interior relativamente a factos que para o marido, não deixam de ser, morbidamente impressionantes e grandiosos. 

A última perspectiva, a do intendente de sangue, dá-nos a conhecer as preocupações económicas do facto de, a principal fonte de rendimento do príncipe, isto é, o imposto sobre o resgate do sangue, estar em decréscimo. Sendo o intendente responsabilizado pela diminuição no número de mortes e, consequentemente, pelo decréscimo do pagamento do imposto, aquele resolve sair do palácio em busca de respostas.  

Este é um livro curioso que me impressionou dado os factos terríveis que relata mas, do qual, ao mesmo tempo, consegui gostar tanto. Um livro que mexe com o nosso interior. Uma escrita com muita qualidade não fosse o autor sido várias vezes nomeado para prémio Nobel e ter já vencido prémios como o Man Booker Prize (2005). Actualmente, vive em França país no qual procurou exílio em 1990 após ter sido intimidado pelo governo albanês. Curioso é o facto de ser dos poucos escritores desta nacionalidade  autorizado pelo antigo regime comunista. 

Foi adaptado para o cinema por Walter Salles. Deixo o trailer abaixo sendo certo que vou procurar vê-lo em breve.


1 comentário:

  1. Estou a adorar a tua participação no nosso pequeno projecto! Adoro o facto de pesquisares sobre o país! Também faço isso... Eu também li um de Kadaré e fiquei maravilhada com a escrita dele! Estou a ter alguns problemas em compilar autores de Andorra... São mesmo pouquinhos! Beijinhos

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